Coach do Coach

Os melhores profissionais e as melhores equipas têm um denominador comum: serem peritos nas competências intra e inter que perfazem as relações interpessoais entre todos os objectivos, as ferramentas e os meios.


terça-feira, 26 de dezembro de 2017

As dinastias das vitórias no futebol

Após algum tempo longe do blog, estou de volta. Deixo aqui alguns textos que apesar de se focarem em contextos específicos, são - na minha opinião - transversais.

Este saiu no Sapo 24:

Uma das características do ser humano é o seu desejo pelo sucesso, especialmente em contextos muito competitivos, como são as equipas de futebol. O sucesso no alto rendimento traduz-se em vencer, se possível, o maior número de vezes. O que leva uma equipa a vencer e atingir o sucesso é algo que motiva todos os agentes desportivos ligados ao fenómeno, especialmente se essas vitórias puderem ser regulares e até quem sabe atingir algo melhor que o sucesso pontual, que são as dinastias de vitórias.

Os treinadores costumam dizer que chegar ao topo é muito complicado, mas manter-nos lá é ainda mas difícil. Não só porque não existem receitas concretas para o sucesso, como todos os campeonatos têm contextos distintos e quem vence permite sempre que a concorrência possa adaptar as suas estratégias de modo mais célere e com menos experiências.

A ciência denomina de equipas de elevado desempenho as que vencem constantemente campeonatos, dado que diferenciam das que ‘apenas’ vencem, pela questão temporal. Esta época desportiva são poucos os campeões que vão renovando a liderança dos seus países. Das ligas principais, e por agora, somente o Bayern repete a liderança e possivelmente o título.

De modo muito objetivo, assistimos a dois fenómenos esta época: o (re)aparecimento de novas equipas com mais recursos e melhores estratégias; e algumas vitórias da época passada não foram de equipas de dinastia, mas de uma espécie de corredores por fora. Por outro lado, a dinastia provoca uma bipolaridade de análise interna: vencer é a melhor motivação que existe para continuar a vencer; mas mesmo vencendo é necessário internamente que a estrutura organizacional se sinta sempre ameaçada. Um pouco como faz o tenista Nadal: tem a convicção de que pode vencer qualquer adversário, mas também a desconfiança que pode ser vencido por qualquer um, de modo a manter sempre os níveis de alerta.

O orgulho de pertença e o desejo constante de melhoria são duas das características que aparecem ligadas à dinastia. Um misto entre manter um núcleo de jogadores com qualidade que sintam a camisola, mas equilibrados com um misto de jogadores que querem sentir a vitória pela primeira vez. Um misto de jogadores que compreendam a cultura do clube e outros que naturalmente desejam ter títulos dê por onde der. Este equilíbrio, associado a um contexto competitivo exigente, acresce da necessidade de ter de ‘correr’ o dobro, dado que não é suficiente fazer as coisas bem, têm de se diferenciar sempre e de modo superior.

Quase a entrar nos descontos do artigo, o que se pede a Rui Vitória no Benfica é que faça a mesma omelete com diferentes ovos. Em que claramente, sem querer distribuir percentagens de responsabilidades nas vitórias e nas derrotas, nem tudo depende pela mesma margem da estrutura, da liderança e do treinador. A discussão sobre se os ovos são apenas diferentes ou piores, é outro tópico. O contexto de hoje é mais exigente, porque vencer 3 campeonatos é mais complexo do que 2 e consecutivamente.

A concorrência tem o papel facilitado de perceber com quem faz teoricamente melhor. Nem sempre ficam no plantel os jogadores que eram os que se pretendiam entre o ideal e o possível, entre os que sentem a camisola e querem continuar a vencer ou aqueles para quem o vencer deixa de cativar tanto como na primeira vez. Usando a expressão de Rui Vitória, a dinastia não é uma coisa fácil e por isso é que não é para todos ao nível dos vários campeonatos europeus.

Por último, o abismo entre a soberba, desleixo, rigor e ambição é como a vida dos treinadores. Se não nos colocamos sempre em alerta, também as equipas passam de bestas a bestiais e vice-versa. A dinastia é atraente para a história, para os filmes, mas pouco atraente para a economia. E o enviesamento entre o que se deseja e o que o contexto natural das coisas deveria ter é pouco usual na nossa sociedade. Por isso, quem quer vencer mais vezes do que os outros sabe que tem de trabalhar mais e melhor do que aquele que está próximo.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

A desresponsabilização do resultado

Mais uma crónica no MaisFutebol!

Um dos riscos dos treinadores e dirigentes culpabilizarem constantemente o exterior é a criação de uma certa cultura de desresponsabilização que possa passar uma mensagem errada para os atletas. E quando escrevo errada não é no sentido ético ou social. É errado porque pode criar nos atletas uma sensação que o que fazem é melhor ou menos errado do que a realidade. E com isto a capacidade de autocrítica é menos concreta e construtiva.

Não quero com isto assumir que os clubes se queixam sem fundamento. Existem vários casos que podem dar razão ao clube que se queixa. Mas a verdade é que quando esses clubes são beneficiados (e são quase todos) não se vê esse sentido crítico ou essa coerência e os jogadores podem ser levados a acreditar que fizeram tudo bem e que não há tantas coisas a melhorar. O velho exemplo de que quando o atleta é titular é mérito dele e quando não joga é por opção do treinador. Ou seja, o que é bom é meu mérito o que é menos bom é da responsabilidade dos outros.

Os melhores atletas são motivados de modo intrínseco. Podemos retirar várias informações por aqui e uma delas é que esses atletas têm uma maior capacidade de se motivarem por eles próprios do que os que são motivados de modo extrínseco, ou seja, por fatores externos a si. Geralmente pelo reconhecimento que têm, colegas, ambientes de estádio, objetivos criados pelos seus líderes.

Mas também pressupõe outro aspeto bastante importante: os atletas motivados mais pela questão extrínseca também são mais permeáveis a aspetos negativos. Ansiedade, ambientes conflituosos, ruídos, desresponsabilização das suas ações, etc. E quando um plantel se vê no meio de uma disputa de acusações e desresponsabilizações, nem todos têm a capacidade de discernir que dentro dos possíveis erros dos árbitros ou outros agentes desportivos, há uma percentagem pequena ou grande de aspetos que devem ser melhorados e que são garantidamente da sua responsabilidade. 

O risco de não se dividir que os árbitros erram de os insucessos da equipa se devem exclusivamente a esses erros, é que com esta última afirmação, retiramos dos atletas qualquer responsabilização e consequência do que fazem menos bem. E com isto deparamo-nos com um aspeto interessante de ser analisado: é que quando essas equipas não vencem e não há nada a apontar aos outros agentes desportivos envolvidos, os atletas têm alguma dificuldade em conseguir de modo claro, conciso e concreto em compreender onde podem claramente melhorar.