Coach do Coach

Os melhores profissionais e as melhores equipas têm um denominador comum: serem peritos nas competências intra e inter que perfazem as relações interpessoais entre todos os objectivos, as ferramentas e os meios.


quarta-feira, 28 de setembro de 2016

O que é o making-sense de um líder? Treinador? Professor?

Artigo do Mais Futebol desta semana! Aproveitar o exemplo de um dos treinadores portugueses. 

O treinador do Sporting esteve em foco mais uma vez pelas suas palavras. Uns concordam, outros não. Uns dão-lhe o benefício da dúvida, outros nem tanto. Mas quem interessa saber o que pensam daquilo que Jorge Jesus diz é a sua equipa e os seus jogadores. E quando afirmo que interessa saber o que os jogadores entendem das palavras do seu líder, é porque está mais do que provado que as mensagens do seu treinador são das ações que têm mais impacto na motivação dos jogadores. E os treinadores sabem isso. Ou deveriam saber.

O que tem a ver com isto o termo making-sense?

De tempos a tempos somos confrontados com estrangeirismos. Uns ficam outros nem tanto. Mas o que é isto? É um processo sobre a narrativa que criamos e que nos permite um espaço apropriado onde examinamos a identidade e permite coabitar com as ambiguidades e contradições existentes de quem lidera. Um processo que podemos observar nos treinadores, educadores, professores, etc. E permite ao autor da narrativa explicitar o seu ponto de vista sobre algo e reconhecer que ao contar a sua história sobre si ou outro, concede-lhe a vantagem de usar o seu filtro para condicionar positivamente com as informações temporais, culturais, históricas ou espaciais.   

O que isto tem a ver com Jorge Jesus ou com os treinadores? Os treinadores convivem muito num processo solitário. Para lá da equipa técnica e do perfil de líder de cada um, o treinador pensa e repensa muito na sua mente. Uma tentativa constante de criar através do seu estilo interpessoal uma especial influência no comportamento do atleta e essa relação baseia-se muito em tudo o que é comunicação.

Quase que podemos retirar daqui que é um processo consciente e intencional de criar um discurso e uma filosofia com a tentação de motivar e alinhar todos numa só direção. De que aquilo que cada treinador gostaria de dizer, que seja dito de modo a criar um efeito positivo nos seus jogadores. E o making-sense de Jorge Jesus? Nós não privamos nos espaços fechados entre JJ e a sua equipa. Por isso analisamos aquilo que nos é possível receber. A comunicação de JJ nas conferências, pré e pós-jogos e durante os jogos! E o que vemos?

Que Jesus é dos poucos treinadores que ainda mantém uma vertente genuína tão grande que nos faz parecer que o making-sense de JJ é quase nulo. E que isso nos permite, quando ouvimos JJ, pensar que de facto o treinador português considera que tem uma crença enorme que aquilo que pensa não deve sofrer qualquer filtro perante o discurso para dentro e para fora.

O que fez com que JJ viesse posteriormente dizer que afinal as suas palavras eram outras e com outro significado é uma novidade. E é este fenómeno do treinador do Sporting vir pegar nas suas palavras que é bastante interessante, pois significa que JJ – ou outro responsável – percebeu que as palavras poderiam ter um impacto negativo nos seus jogadores. E todos nós sabemos que o treinador deve incutir na sua comunicação e ação uma coerência e uma eficiência fundamental. Daí a importância do mesmo preparar-se, criar uma identidade ou uma marca, saber transferir, criar e treinar a sua narrativa para que a mesma ajude a atingir os seus objetivos. 

E só tempo dirá se Jorge Jesus irá manter-se fiel às suas crenças ou não.

terça-feira, 20 de setembro de 2016

Todos os treinadores conseguem ser líderes?

Crónica no MaisFutebol desta semana.

A discussão não é recente mas também vai vivendo de crenças. Várias. Mas felizmente o tempo vai-nos dando cada vez mais episódios para se observar e analisar sobre diversos treinadores que em diferentes etapas da sua carreira vão conseguindo com maior ou menor dificuldade impor as suas ideias. Por outro lado, outros treinadores com inúmeras oportunidades raramente conseguem atingir os resultados que teoricamente os jogadores fariam prever.

Para destacar os que mais vencem, poderíamos colocar nesta lista mais atual nomes como Guardiola, Mourinho ou Ancelotti, sabendo que de fora ficam muitos mais. Mas mesmo estes três também perdem. E quando perdem, todos nós disparamos um conjunto de razões em que tentamos encontrar relação direta entre os resultados e as ações que acontecem em campo. E não lhes falta na grande maioria das vezes recursos para que atinjam quase sempre bons resultados. Do outro lado também existem adversários, é verdade, mas também sabemos que há qualquer coisa mais para lá disso.

E o que é? Colocaria o tema da liderança ao barulho. E como? A verdade é que a alta competição é fria, cruel e está sempre à procura do falhanço para nos fazer lembrar que quem joga e vence são os jogadores. E são os jogadores porque são eles que pela regra podem andar lá dentro a lutar, correr, rematar, defender, etc.

Pode parecer La Palice, mas é mesmo assim. Onde entra então o treinador? Até porque eles possuem muito conhecimento, mas isso hoje em dia é cada vez mais facilmente possível captar em cursos, internet, observando ou copiando. Mas não é isto que faz a diferença!

O que faz a diferença é a capacidade e a habilidade de transferir para os jogadores o conhecimento. Aquilo que o treinador pretende que seja realizado. E ainda mais importante, o como! E aqui entra a liderança, o seu conjunto de ações. Crenças, motivações, perfis comunicacionais e relacionais. É isto que também diferencia os bons e maus momentos das equipas. O treinador maestro é diferente de treinador ditador. Maestro não apenas para gerir e ter à sua disposição um conjunto de talentos, mas para lhes dar mais liberdade, autonomia nuns momentos e controlar e comandar noutros. E Mourinho, Guardiola, Conte, Fernando Santos por exemplo sabem isso melhor do que qualquer um de nós. E também se questionam porque às vezes o seu perfil é o mais adequado para conseguir que os seus jogadores estejam no topo da motivação e foco e por outras vezes não seja suficiente.

Como podemos analisar ou responder a esta questão? Se retirarmos os treinadores em escalões de formação – e mesmo aí a discussão levaria muito tempo para encontrar respostas próximas da unanimidade -, todo o treinador treina para que as suas equipas e atletas vençam. E quando não vencem, mesmo que seja contra adversários teoricamente mais poderosos, fica sempre um sentimento de insatisfação ou desalento.

Percebe-se que os treinadores se auto-titulam de líderes. E também concordaria. Precisando primeiro de questionar qual a definição de liderança que cada um de nós utiliza. Os verbos que agarramos à tarefa de liderar são importantes para nos auto-definirmos como líderes, mas depois de falar com vários treinadores e observar como as equipas reagem, percebe-se que é importante destacar isto: os treinadores mandam e comandam nem que seja à pressão, mas isso na minha opinião já não é liderar!

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

As competências que (não) existem no desporto

Crónica com seis anos e cada vez mais actualizada. Infelizmente...

“As competências que (não) existem no desporto”

Dizem que há uma primeira vez para tudo. Esta será a minha primeira crónica, deixando de lado a rigidez técnica dos livros. Tempos houve que também realizei as minhas primeiras críticas ao que se passava no desporto. Não sei se de uma forma mais descontextualizada, menos fundamentada ou com mais emoção.
Mas desde há algum tempo que assumo que abordar o fenómeno desportivo com a racionalidade exigida, é uma tarefa que implica alguma coragem e perspicácia, pois o desporto propriamente dito, e tudo o que o rodeia, é um assunto para a grande maioria da sociedade, de senso comum e de ‘entendedores curiosos’, o que dificulta qualquer abordagem mais técnica e rigorosa.


Não quero com isto dizer que as pessoas não possam dar a sua opinião sobre ‘isto’ ou ‘aquilo’. Nada disso! Até porque a criação de requisitos para abordar o desporto tinha outra repercussão, que seria a eliminação de uma grande quantidade de trabalhos por serem ocupados por pessoas pouco qualificadas.
A actividade desportiva tem sido utilizada com maior frequência como meio propedêutico, de estimulação ou de potenciação de uma forma de estar na sociedade que poderá ser definida como mais correcta. Através de diversos projectos utiliza-se o desporto no voluntariado e vice-versa, como forma de tornar os cidadãos mais activos, de participarem nas actividades sociais, de aprenderem a partilhar, a trabalhar em equipa ou aprender a perder e também a ganhar.

Uma simples história conta que um dia uma mãe levou o filho até Ghandi e pediu-lhe que fizesse algo para que o filho começasse a comer arroz. Ghandi, calmamente pediu que a mãe voltasse com o seu filho passado uma semana. Após uns dias os dois dirigiram-se novamente a Ghandi. Este virou-se para o filho e disse-lhe “A partir de hoje irás comer arroz”, virando-lhe depois as costas. A mãe, algo estupefacta, afirmou “Porque me mandou voltar passado uma semana para lhe dizer somente isto?”. Ghandi respondeu-lhe que há uma semana também ele não comia arroz.

Hoje acredito mais no que faço e que sou melhor também por isso. Não me basta coração ou emoção, mas ajuda. Junto a isto um conhecimento académico e prático e proporciono a hipótese de aprender mais ou acomodar-me.
O trabalho efectuado com várias populações deu-me a conhecer as potencialidades da actividade desportiva e recreativa como forma de ensinar novos e velhos, populações carenciadas e privilegiadas, do interior e do exterior, activas e sedentárias, interessadas e desinteressadas.

E olhando para o nosso país, algo vai mal nas pessoas que estão à frente de todo um fenómeno desportivo. Não acredito que estejamos a ‘8’, mas estamos sem dúvida longe, muito longe, do ‘80’.

Existem bons dirigentes desportivos, mas poucos deles em posições de decisão. Exemplos de más decisões, corrupção, dívidas, politicas desajustadas, ‘quintais’, etc. Fico com algumas dúvidas se será a imagem do país ou o contrário.
Falo muito para além de o facto de continuarmos na cauda da União Europeia no que diz respeito ao índice da prática desportiva. Claro está que tudo terá uma relação.

Mas é estranho, sem dúvida, utilizar o desporto como forma de desenvolver competências e que serão alicerces na forma como encarar desafios na vida em geral e continuarmos (de forma crescente) a ser bombardeados com exemplos como temos sido.


Torna-se difícil definir as competências que os técnicos deverão ou não possuir, pois as áreas relacionadas directa ou indirectamente com o desporto são diversas. Seria talvez mais fácil ir pelas características que um profissional não deverá possuir!


Caberá a todos decidir se queremos continuar a ser um país que vive de dirigentes desportivos (e não só) mesquinhos, que investem o seu tempo no mal dizer e na procura incessante do protagonismo, ou pretendemos algo sério, aproveitando as oportunidades criadas pelo desejo das pessoas quererem algo melhor e começarem a ficar fartas de viver neste mar de oportunidades de fazer mal e de contínua impunidade.

Sei que o desporto ajuda-nos a ser activos e empreendedores, obriga-nos a pensar em estratégias e soluções, potencia situações de sacrifício e espírito de equipa, ocupa a mente e o tempo com qualidade, mas até quando existirá a diferença abismal que temos assistido entre o dizer e o fazer?"

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Como gerir as boas dores de cabeça?

O primeiro texto da época desportiva para o Mais Futebol! Aqui vai.

Após o término do mês de Agosto e a época mais agitada de entradas e saídas nos plantéis, aos poucos os treinadores vão arrumando as ideias e as posições nos plantéis. Não as posições táticas de cada jogador, mas sim, as posições quase que hierárquicas nas suas equipas. E com isso, posições em constante mudança considerando os estados físicos, táticos e mentais de cada jogador.

A verdade é que com maior ou menor dificuldade, as equipas, especialmente os grandes, conseguiram recompor os seus plantéis mesmo com as saídas que todos os anos dão alguma receita às suas contas e por outro lado, levam quase sempre os melhores jogadores do plantel.

O campeão Benfica tem dois jogadores de créditos firmados para quase todas as posições – talvez Jonas seja o único que ainda não tenha um substituto quer em termos de qualidade quer em termos do que faz e do que pesa para a equipa – e existem zonas onde há mais do que dois jogadores. O Sporting de Jorge Jesus soube nos últimos dias de mercado salvaguardar a necessidade de ter um plantel mais equilibrado, especialmente do meio-campo para a frente com a entrada de vários jogadores, uns a título definitivo e dois emprestados. O Porto com algumas segundas opções como foi o caso de Boly, mas a verdade é que Oliver e Diogo Jota permitirão que no meio-campo e no ataque possam existir vários modelos que são possíveis face aos atletas que entraram, sendo um deles e bastante importante, o recuperado Brahimi.

Como gerir qualidade? Como manter os atletas constantemente motivados mesmo quando não jogam, sabendo que por vezes e por estranho que pareça, mesmo jogando podem não estar totalmente motivados? E a qualidade que para o adepto está lá e que o treinador não tem a mesma opinião? Ou qualidade que não conseguimos ainda observar, mas o treinador vai conseguir descobrir?

Manter jogadores motivados e focados que à partida podem pensar que a sua qualidade e dedicação é suficiente para ter o tal lugar no onze não é nada fácil. Lê-se e relê-se várias entrevistas de jogadores que por vezes estão desmotivados ou descontentes e percebemos que acima de tudo há necessidade de responder às exigências pessoais. Os tais objetivos individuais. E que desejaríamos todos que estivessem sempre abaixo e alinhados com os coletivos, mas isso é uma enorme miragem.
Como explicar a alguns jogadores que o seu momento não chega porque os ‘outros’ não falham? Não dão margem? E porque têm mais ferramentas na opinião do treinador?

Costuma-se afirmar que isto é um bom problema para os treinadores. Ter em excesso é melhor do que não ter. Até pode ser verdade, mas também não é mentira que essa situação proporciona tantas ou mais dificuldades, pois deixa de haver necessidade de criar opções e alternativas para procurar e encontrar soluções para posições ou adversários e passa a existir a necessidade de saber gerir jogadores que estão motivados em excesso e não podem contribuir com aquilo que eles mais gostam.

Em conversas com alguns treinadores sobre estes temas, percebe-se que há treinadores que observando estas situações e quando os jogadores começam a deixar-se ir, tentam resgatá-los dando oportunidades. Mas o jogador pode não estar efetivamente preparado e não só perde o que já poderia ter, como perde ainda mais oportunidades futuras. Outros treinadores consideram que jogando os mais preparados não existe modelo mais justo que esse. E quem quer aceita quem não quer…